ENTENDA

Como esse vício 'moralmente aceito' afeta sua saúde mental e financeira

Descubra como o excesso de estímulos digitais afeta sua memória, decisões financeiras e bem-estar — e como a inteligência emocional pode te ajudar.

COTTONBRO STUDIO/PEXELS

Pessoas de diferentes idades mexem em celulares; excesso de estímulos afeta saúde financeira

Publicado em 1/7/2025 - 6h00

Estamos sobrecarregados! Sobrecarregados de estímulos que ativam a dopamina — um neurotransmissor produzido pelo cérebro, essencial para o sistema de recompensa. Redes sociais, videogames, smartphones, computadores e apostas online intensificam esse bombardeio, diminuindo a sensibilidade do cérebro ao prazer. Como consequência, passamos a buscar mais e mais interações para sentir a mesma satisfação inicial.

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É como se o cérebro estivesse em uma festa interminável, com luzes piscando o tempo todo. Curtidas, notificações, apostas em "bets", mensagens instantâneas: tudo isso eleva a dopamina a níveis extremos e vicia. Com o tempo, o cérebro cria uma resistência, exigindo estímulos maiores — ou, em sua ausência, experimentamos queda no humor e nos tornamos mais vulneráveis à depressão, ansiedade, perda de memória e dificuldade de concentração.

Antigamente, sabíamos de cor os números de telefone dos nossos pais e amigos. Hoje, talvez só o nosso. Antes do Waze, havia o guia Quatro Rodas. Olhávamos o mapa, memorizávamos o trajeto e seguíamos com atenção. Hoje, tudo está na palma da mão — mas à custa de carga cognitiva.

Segundo o neurologista Leandro Teles, membro da Academia Brasileira de Neurologia, a memória depende de três funções básicas: atenção, filtragem e relevância. "O difícil é que tudo hoje vem com uma roupagem de urgência, e fica difícil para o cérebro distinguir o que realmente importa", explica.

Jovens, em especial, são mais impactados: fazem tarefas escolares enquanto jogam, checam e-mails, assistem vídeos e respondem mensagens — tudo ao mesmo tempo. Essa hiperatividade digital compromete a atenção e, com ela, a memória.

Todos os dias, tomamos cerca de 32 mil decisões. A maioria é automática. Mas algumas requerem um cérebro afiado, como evitar compras por impulso. Uma pesquisa da Serasa mostrou que sete em cada dez brasileiros admitem se arrepender de compras feitas sem planejamento. E com os algoritmos das redes sociais, que sabem exatamente como nos atrair com propagandas certeiras, o consumo impulsivo cresce. A mesma Serasa aponta que 82% dos brasileiros fazem ao menos uma compra online por mês — sendo as mulheres as mais vulneráveis.

O psicólogo britânico David Lewis chama esse fenômeno de fadiga informativa. Embora pese apenas 1,5 kg, o cérebro consome 20% do oxigênio, sangue e glicose do corpo. Quando sobrecarregado, perde a capacidade de processar decisões com clareza — prejudicando o sono, elevando a irritabilidade, acentuando quadros de ansiedade e, em casos extremos, desencadeando síndrome de burnout.

Essa sobrecarga também pode afetar o bolso: dívidas no cartão, sensação de fracasso, isolamento e procrastinação viram sintomas colaterais. É aí que entra a inteligência emocional.

Desenvolver inteligência emocional é essencial para equilibrar saúde mental e educação financeira. As emoções estão diretamente ligadas às decisões com dinheiro. A inteligência emocional financeira vai além de controlar gastos: ela permite identificar os gatilhos que nos levam a gastar, planejar metas e atingir objetivos com mais clareza.

Uma dica prática é definir metas de curto e longo prazo. Cumprir uma pequena meta ativa o circuito de recompensa do cérebro, liberando dopamina e endorfina, que geram bem-estar e incentivam a continuidade do hábito. Conhecer suas emoções e padrões é essencial.

Decisões financeiras feitas em momentos de ansiedade tendem ao erro. Eufórico? Você tende a gastar mais. Estressado? Pode comprar para aliviar a tensão. De acordo com o SPC Brasil, um terço dos brasileiros compra para aliviar o estresse. Nos EUA, pesquisa da Universidade Northwestern aponta que 52% fazem isso para melhorar o humor.

Se o hábito se torna compulsivo, com compras escondidas ou frequentes dívidas, é hora de buscar ajuda. Existem grupos como os Devedores Anônimos, inclusive online, e serviços como o Ambulatório de Transtornos do Impulso da USP.

A inteligência emocional envolve cinco pilares, segundo o psicólogo Daniel Goleman:

  • Autoconhecimento emocional: identifique como seus sentimentos influenciam seus pensamentos e comportamentos. Meditação, mindfulness e hobbies como música ou esportes ajudam.
  • Autocontrole: gerencie impulsos, especialmente em situações de raiva ou pressão. Uma pausa de 10 minutos com respiração guiada já pode ajudar.
  • Automotivação: persevere nas metas, mesmo com dificuldades. Imagine o prazer de uma viagem em família ou de alcançar uma meta simples como almoçar fora com os filhos.
  • Empatia: compreenda os sentimentos dos outros. Reconhecer emoções no ambiente melhora relações pessoais e profissionais.
  • Habilidade social: comunique-se bem, desenvolva vínculos reais, trabalhe em equipe. Laços afetivos sólidos aumentam a longevidade e ajudam no enfrentamento de crises.

Uma revisão de 148 estudos das universidades de Brigham Young e North Carolina mostrou que pessoas com amizades sólidas têm 50% mais chances de viver mais.

Proponho um desafio: que tal superar a preguiça e marcar um café com os amigos? E, ao se encontrar, deixar o celular de lado. Aposte menos nas "bets" e mais na vida real. Reduza o excesso digital e conecte-se mais com o que importa: seu mundo analógico, sua saúde mental e seu equilíbrio financeiro.


*As opiniões do colunista não refletem, necessariamente, o posicionamento do Economia Real.

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