DINHEIRO EM JOGO
DIVULGAÇÃO
Divulgação da partida entre Boa Vista (RJ) x Portuguesa (SP), exibida irregularmente no YouTube
Publicado em 4/5/2025 - 5h00
A Série D, quarta e última divisão do Campeonato Brasileiro, está no centro de uma nova crise. A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) proibiu os clubes de transmitir os jogos por conta própria, sob risco de punição, enquanto negocia um acordo para exibir as partidas na TV ou em alguma plataforma de streaming. Enquanto isso, o torcedor que quiser acompanhar o jogo do time do coração só consegue fazer isso de uma maneira: no estádio.
Na Série D estão presentes times como Portuguesa (SP), Santa Cruz (PE) e América (RN), além de outros com pouca estrutura e sérias dificuldades financeiras. A CBF arca com as despesas da competição, como passagens, hospedagens e premiação.
Ocorre que o regulamento da competição, no artigo 32, determina que todos os direitos comerciais da Série D pertencem à entidade. Assim, os 64 clubes da última divisão foram obrigados a cancelar parcerias comerciais e estão impedidos de buscar novos acordos.
"Muitos clubes enfrentam desafios estruturais. Alguns precisam reformar estádios ou alugar outros espaços para disputar os jogos. Isso aumenta os gastos e agrava a situação financeira dessas equipes", explica Mariana Araújo, advogada especializada em direito desportivo e de entretenimento do escritório Ambiel Advogados, ao Economia Real.
Para a especialista, a ausência de incentivos aos clubes das divisões inferiores prejudica o sistema. "A CBF cresce, mas a Série D continua sendo um entrave financeiro", comenta.
Fontes da reportagem nos times da Série D revelam, em condição de anonimato, que no dia 11 de abril, durante o Conselho Arbitral com os 64 clubes, a CBF reforçou que os direitos de transmissão são exclusivamente seus.
Isso gerou atritos com clubes que já haviam firmado acordos com o canal GOAT ou encaminhado parcerias, como Portuguesa (SP), Treze (PB) e equipes de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Maranhão. Todos usaram como base a Lei do Mandante, que permite ao clube mandante negociar diretamente a exibição.
"A obrigatoriedade desse termo coloca os clubes em posição de dependência. Para participar, precisam aceitar as regras da CBF, mesmo que isso limite sua autonomia comercial", afirma Mariana.
O Economia Real teve acesso ao ofício assinado pelo diretor jurídico da CBF, André Mattos, no qual a entidade declara estar em negociação com empresas para transmitir os jogos. Enquanto isso, os clubes seguem proibidos de exibir as partidas, nem mesmo em seus próprios canais.
Na estreia da competição, o Boavista (RJ) ignorou a recomendação e transmitiu o jogo contra a Portuguesa (SP) pelo YouTube, conforme divulgado na foto presente no começo da reportagem.
Após a partida, a equipe consultou a agência Pallas, contratada pela CBF para a logística da competição, e descobriu que a ajuda de custo havia sido suspensa — embora a entidade não confirme nem negue qualquer punição. A Portuguesa, mesmo sem ser a mandante, não comentou oficialmente, mas segundo fontes, teme retaliações.
O Maricá, outro clube fluminense, recuou horas antes do confronto contra o Rio Branco (ES). Em nota oficial, afirmou ter recebido um comunicado da CBF proibindo transmissões até mesmo pelos canais próprios. "Nossa equipe já estava no local preparando a estrutura, mas, por decisão da entidade, a transmissão foi cancelada", informou.
A ausência de transmissão reduz a visibilidade dos clubes, prejudica a captação de patrocinadores e limita o alcance comercial das equipes”, alerta a advogada.
Além dos clubes, quem perde é o fã de futebol. Com partidas espalhadas por todos os estados e o Distrito Federal, a transmissão é a única forma de muitos torcedores acompanharem seus times. Sem isso, restam apenas os ingressos para os estádios, o que exclui uma grande parte do público.
"A negociação dos direitos de transmissão deve buscar equilíbrio e sustentabilidade. Um acordo transparente, estratégico e inclusivo pode beneficiar todos os envolvidos", comenta Mariana.
Até o fechamento desta reportagem, a CBF segue em negociações com uma empresa cuja identidade ainda não foi revelada. Segundo Reinaldo Carneiro Bastos, presidente da Federação Paulista de Futebol, a entidade deve esperar até a terceira rodada da Série D, iniciada ontem (3). Caso ocorra alguma definição, os clubes podem ser autorizados a retomar suas transmissões.
O Economia Real entrou em contato com a CBF ao longo da última semana, mas a entidade decidiu não se pronunciar sobre o assunto.
Política de comentários
Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.