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Medo, ansiedade e impulso: os três sabotadores invisíveis do seu planejamento financeiro
Publicado em 15/7/2025 - 7h00
Dinheiro e emoção sempre caminharam lado a lado. Embora as finanças pessoais sejam frequentemente tratadas como um tema puramente racional (com planilhas, cálculos e metas), a realidade é bem diferente. A parte visível da nossa vida financeira, os números, na verdade, esconde uma complexa rede de emoções, experiências e crenças. E entre os sentimentos que mais sabotam nosso orçamento e planejamento financeiro estão o medo e a ansiedade.
O medo é uma emoção primitiva, essencial para a sobrevivência humana. Ele é gerado pelas amígdalas cerebrais, estruturas do sistema límbico responsáveis por processar ameaças e regular reações emocionais. Em contextos de risco real, como fugir de um predador, ele é crucial. Mas no universo financeiro, esse mesmo instinto pode ser profundamente sabotador.
O economista comportamental Daniel Kahneman (1934-2024), vencedor do Prêmio Nobel de Economia e autor do livro "Thinking, Fast and Slow", destaca a aversão à perda como um dos vieses mais fortes que influenciam nossas decisões financeiras.
Segundo ele, as pessoas sentem o impacto emocional de uma perda com o dobro da intensidade do prazer gerado por um ganho equivalente. Esse viés nos torna excessivamente cautelosos ou até irracionais: vendemos ativos em momentos de baixa, com medo de quedas maiores, e realizamos prejuízos que poderiam ser apenas temporários. O medo nos tira do jogo antes da recuperação.
Esse comportamento é ainda mais evidente em cenários de instabilidade econômica. Estudos demonstram que altos níveis de estresse financeiro afetam diretamente nossa capacidade de tomar decisões racionais. Uma pesquisa publicada no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences, conduzida por pesquisadores da Cambridge Judge Business School, mostrou que flutuações hormonais — especialmente do cortisol — afetam significativamente a tolerância ao risco financeiro.
Em um experimento anterior com traders na cidade de Londres, os mesmos pesquisadores observaram que os níveis de cortisol aumentaram em até 68% em apenas duas semanas, acompanhando a volatilidade do mercado. O cortisol, hormônio liberado em situações de estresse, ativa a resposta de "lutar ou fugir".
Quando se mantém elevado por longos períodos, como em crises econômicas, ele prejudica a memória, aumenta a ansiedade e reduz a disposição para assumir riscos, levando a decisões financeiras mais conservadoras e, muitas vezes, ineficazes.
A ansiedade financeira é uma preocupação constante e difusa de que algo vai dar errado — mesmo quando nada concreto aconteceu. Pode ser disparada por boletos acumulados, alta da inflação, dívidas no cartão de crédito ou até pela simples sensação de que "nunca é suficiente".
Essa ansiedade coloca o cérebro em estado de alerta contínuo. Segundo Brad Klontz, psicólogo financeiro e autor de "Mind Over Money", grande parte desse comportamento está relacionada aos chamados roteiros financeiros inconscientes — crenças internalizadas ao longo da vida, geralmente herdadas de experiências familiares.
Pessoas que cresceram em contextos de escassez ou instabilidade econômica, como a hiperinflação vivida no Brasil nos anos 1980 e 1990, muitas vezes carregam um medo crônico de perder tudo, mesmo quando sua realidade atual é estável. Esse medo se torna um gatilho constante de ansiedade financeira.
Além disso, a ansiedade pode nos levar à paralisia. Evitamos olhar extratos bancários, abrir faturas ou renegociar dívidas, comportamentos que só pioram o problema. Esse padrão de evitação está bem documentado em estudos de neurociência comportamental, que mostram como a ansiedade afeta diretamente o córtex pré-frontal, comprometendo o raciocínio lógico e dificultando a tomada de decisões.
Paradoxalmente, essa mesma ansiedade também pode levar ao consumo impulsivo. Isso ocorre porque compras liberam dopamina, um neurotransmissor associado à sensação de prazer e recompensa imediata. Em vez de enfrentar a origem do estresse, buscamos alívio rápido com o consumo — o que pode gerar ainda mais desequilíbrio nas finanças pessoais.
Especialistas em finanças comportamentais, como Kahneman e Klontz, afirmam que a chave para decisões financeiras mais saudáveis não está apenas nos números, mas na mente de quem os calcula.
Algumas estratégias comprovadas podem ajudar:
Como mostram os estudos, não basta cuidar do bolso — é preciso cuidar da mente que o gerencia. Entender os impactos da saúde mental sobre o dinheiro é um passo essencial para desenvolver um relacionamento mais equilibrado com as finanças.
*As opiniões do colunista não refletem, necessariamente, o posicionamento do Economia Real.
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