DENTRO DOS NEGÓCIOS
ILUSTRAÇÃO/CHATGPT
Dois potes simbolizam finanças pessoais e empresariais com moedas misturadas (imagem gerada por IA)
Publicado em 29/9/2025 - 11h00
Misturar as finanças pessoais com as da empresa é um dos erros mais comuns entre pequenos empreendedores e também um dos mais perigosos. A prática compromete o fluxo de caixa, mascara a real saúde financeira do negócio e pode até dificultar o acesso a crédito. Especialistas ouvidos pelo Economia Real explicam os riscos e mostram como adotar a disciplina necessária para separar de vez o que é da empresa e o que é do bolso do dono.
"Geralmente os pequenos negócios iniciam como uma atividade informal, onde de fato os recursos se misturam. Isto facilita a utilização de contas pessoais para as novas atividades. Some-se a isto a falta de uma mais sólida educação financeira", explica José Carlos de Souza Filho, professor da FIA Business School.
Vinicius Roveda, CEO da Conta Azul, acrescenta que muitos empreendedores ainda enxergam a empresa como uma extensão de si mesmos. "Eles pensam: 'Eu sou o único dono, então o dinheiro da empresa é meu'. Essa visão é um grande erro", comenta.
A consequência imediata é a perda de controle do caixa. "O primeiro problema surge na indefinição do que é da empresa e do que é do empreendedor, que tende a usar recursos do negócio para suas contas particulares. Se em excesso, poderá causar uma falta de capital de giro para o negócio", detalha Souza Filho, que também alerta para o aspecto fiscal.
O fisco entende que se trata de dois entes distintos. Se o empreendedor retirou valores da empresa, provavelmente terá que se acertar com o IR, e dependendo da situação, com multas e outras penalidades", complementa.
Rogério Parente, diretor do IPEG, lembra que a falta de separação financeira também atrapalha o desenvolvimento do negócio. "Muitos empreendedores começam sozinhos ou em família, sem apoio de um contador ou economista, e passam a tratar a empresa como extensão da vida pessoal. O problema é que essa prática prejudica a visão real da saúde financeira e impede um planejamento mais estratégico", ressalta.
Além disso, a mistura de contas mina a credibilidade da empresa. "Não fazer esse controle das finanças prejudica o acesso ao crédito, porque bancos e fornecedores avaliam a organização financeira antes de liberar empréstimos ou melhores condições de pagamento", completa Parente.
Na visão dos especialistas, abrir uma conta PJ aparece como passo fundamental. "Talvez o primeiro passo seja entender que a empresa tem vida própria e que o fato de ser o gestor ou proprietário não autoriza tudo. Contas separadas, pagamentos da empresa com contas da empresa e da pessoa física com seus recursos ajudam na organização", observa Souza Filho.
Roveda reforça: "A conta PJ é o ponto de partida, mas a rotina de usar essa conta é o que solidifica a separação". Outro desafio é estabelecer um pró-labore mensal sem comprometer o caixa.
Para o docente da FIA, ele deve ser visto como despesa fixa da empresa. "Um caminho seria a identificação correta das necessidades mensais familiares e ter isto como meta. Em seguida, analisar se a empresa comporta este valor como retirada sem comprometer a sua saúde financeira. Talvez seja melhor investir no negócio, pensando no futuro", detalha.
Na mesma linha, Roveda defende que o pró-labore seja tratado como salário. "O ideal é que o valor do pró-labore seja um percentual do faturamento ou um valor fixo que não comprometa a saúde financeira do negócio. É crucial que esse valor seja retirado apenas uma vez por mês e seja registrado como despesa".
Planilhas simples já ajudam nos primeiros passos, mas a tecnologia pode ser uma grande aliada. "Nesse ponto, a ferramenta ideal é um ERP (sistema de gestão empresarial). Hoje, os ERPs já oferecem uma Conta PJ nativa, o que facilita ainda mais o controle financeiro do negócio", destaca Roveda.
Parente lembra que o segredo está menos na ferramenta e mais na rotina: "O importante não é a tecnologia em si, mas o hábito de registrar e acompanhar. Estabelecer um horário fixo para anotar entradas e saídas já faz diferença enorme na disciplina financeira".
Separar contas também fortalece a relação com o mercado. "Quanto melhor estiver sendo feita a divisão, classificação, escrituração e controle, melhor será a avaliação e o score do negócio. Também ajuda na visão de que o proprietário é organizado e pode responder pessoalmente pelos eventuais créditos concedidos”, reforça Souza Filho.
No fim, a disciplina é o divisor de águas. O professor resume em três passos: "Organize as contas e separe adequadamente as contas pessoais das empresariais; pague primeiro seus credores e depois se pague; e procure entender melhor de finanças se esta não for sua competência no momento".
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