ENTENDA
Juros altos e inflação persistente corroem o salário e aumentam dívidas. Saiba como isso impacta sua vida e o futuro do país.
MARCELLO CASAL JR./AGÊNCIA BRASIL
Cédulas de real; Elaine Bast explica o impacto da inflação no seu bolso ao longo dos anos
Publicado em 7/10/2025 - 12h00
Não é preciso ir muito longe de casa para perceber que o preço de tudo aumentou. Em cinco anos, os preços no Brasil subiram, em média, mais de 34%. Acredito que seu salário ou renda não tenha acompanhado esse reajuste... e, se não teve, é perda de poder de compra na veia.
Nesta quinta (9), o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgará a inflação de setembro — o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), sigla da nossa inflação oficial. Tudo bem, não são os 80% em um único mês, como tivemos, por exemplo, no governo Sarney e durante os sucessivos planos econômicos mal-sucedidos até chegar o Plano Real.
Mas, para quem já não ganha muito, está endividado ou tenta fazer alguma economia, isso mexe com o bolso e com a vida. De pouquinho em pouquinho, vamos perdendo salário.
A expectativa dos economistas é que o IPCA termine 2025 em 4,5%, no limite superior da meta definida pelo governo. Para setembro, de acordo com a prévia da inflação, os aumentos foram, em média, de 0,48%. Mas isso é uma média. A energia elétrica residencial subiu 12,17% no mês — uma cacetada.
Isso, apesar da queda do dólar este ano. Os serviços que consumimos tiveram reajuste médio de 6,17% nos últimos 12 meses. Mas, de novo, é uma média: dependendo do serviço que cada um consome, o impacto no bolso é diferente.
A inflação só não está mais alta porque, além da queda da taxa de câmbio (que barateia vários produtos produzidos e negociados no exterior), o PIB do Brasil está baixo. Os economistas esperam cerca de 2,2% de crescimento este ano. Para um país em desenvolvimento como o Brasil, é uma taxa bem fraca. O que o campo produziu, o que saiu das fábricas, o que foi vendido nas lojas, os serviços prestados, tudo é calculado pelo IBGE.
No primeiro semestre, nosso PIB recebeu, como quase sempre, ajuda do agronegócio, que tem seu melhor período no começo do ano. Só no primeiro trimestre, o setor cresceu mais de 12% — efeito de políticas bem conduzidas e das extensas pesquisas feitas pela Embrapa, que aumentaram a produtividade no campo. Mas, neste semestre, não haverá esse empurrãozinho.
Com a taxa de juros nas alturas (15% ao ano), descontada a inflação, temos a segunda maior taxa do mundo. Fica difícil o país crescer. E fica difícil pagar dívidas. Apesar do avanço das renegociações, segundo a Serasa, somos 77,8 milhões de brasileiros com dívidas atrasadas, bem perto do recorde de julho, de 78 milhões de pessoas. Juros altos e aumento de serviços essenciais, como energia, ajudam a desequilibrar o orçamento.
Pagamos esses juros altíssimos porque o governo gasta muito — seja com despesas obrigatórias ou discricionárias, como as de emendas parlamentares. Os programas de ajuda à população mais pobre são importantes, mas têm um custo alto: este ano, ultrapassaram R$ 400 bilhões. As incertezas que rondam o ajuste fiscal cobram um preço alto: o governo, para pagar dívidas, precisa emitir títulos públicos com juros cada vez maiores.
Chegamos a gastar 8,5% de tudo o que o país produz (o PIB) com o pagamento de juros aos investidores sortudos que têm dinheiro para comprar esses títulos, um recorde em gastos com juros. E se o governo paga mais, imagine nós. O que o governo paga serve de piso para o que bancos e financeiras cobram de quem precisa de crédito. Além disso, com a inadimplência alta, nem todo banco quer conceder empréstimos.
Segundo o Procon, a taxa média cobrada para um empréstimo pessoal este ano chegou a 8% ao mês. Em um ano, são 153% de juros. Quem pegou um empréstimo de R$ 5 mil, por exemplo, pagará R$ 7.650 só de juros em um ano, mais os R$ 5 mil da dívida. É um buraco do qual é difícil sair. Não fossem os feirões de renegociação promovidos por bancos, Serasa e Procons, muitos estariam à beira do superendividamento — quando o pagamento das dívidas compromete o mínimo necessário para uma pessoa sobreviver.
Entre os bancos, de acordo com a Febraban, há um consenso de que a taxa de juros só começará a cair no primeiro trimestre do ano que vem, com reduções de 0,25 ponto percentual no início e depois de meio ponto. As projeções apontam para uma taxa de 13,75% em abril. Mesmo assim, ainda é alta. A boa notícia é que a tendência de queda, em si, já ajuda a destravar o crédito para pessoas físicas e melhora a expectativa do mercado em relação aos juros do dia a dia.
Mas vale lembrar: ano que vem é ano de eleições presidenciais — e, como todos sabemos, isso é uma montanha-russa de emoções no mercado financeiro a cada pesquisa de intenção de voto ou a cada declaração desastrada de candidatos com reais chances de vencer.
Para quem está se afogando em dívidas, a solução é renegociar por prazos maiores e prestações que caibam no orçamento, para conseguir se estabilizar financeiramente, ainda que prazos longos signifiquem mais juros no total. A psicologia econômica já mostrou que juros altos geram estresse e ansiedade. E o estresse financeiro pode levar as pessoas a tomarem decisões impulsivas, como adiar pagamentos essenciais ou, ao contrário, gastar ainda mais e se endividar.
Está provado que nossas decisões financeiras não são racionais, são emocionais. Se o lado emocional está desequilibrado, as decisões também tendem a ser caóticas. Soma-se a isso a falta de educação financeira, que piora o cenário: muitos não entendem como os juros compostos funcionam (e eles são cruéis) e, por isso, acabam pagando o mínimo do cartão de crédito e empurrando o restante da dívida, que cresce exponencialmente.
Também vivemos o "viés do presente", resultado de anos de inflação altíssima, que nos impediu de planejar o futuro. O "agora" sempre foi o agora mesmo, porque no dia seguinte os preços já mudavam — às vezes no mesmo dia. De manhã, um valor; à tarde, outro.
Por isso, há uma tendência de valorizarmos mais as gratificações imediatas do que os benefícios futuros, mesmo que eles representem ganhos maiores. Isso dificulta o aumento da taxa de poupança das famílias e é um "truque mental" que nos empurra para a turbulência financeira, dificultando novos investimentos.
Nada é fácil quando se trata de dinheiro, pelo menos para a maioria dos brasileiros. Para fugir dos juros altos, é preciso vencer esse tipo de comportamento. Sabemos que hábitos são difíceis de mudar. Quem não está acostumado a ir à academia sofre nas primeiras semanas.
É melhor ficar parado. Mas, quando conseguimos nos libertar dos maus hábitos, traçando um plano para equilibrar despesas e receitas e transformando isso em rotina, não só a vida financeira muda: ganhamos tranquilidade, confiança e capacidade de planejar o futuro. Bom para nós, bom para o Brasil.
*As opiniões do colunista não refletem, necessariamente, o posicionamento do Economia Real.