COBERTURA ESPECIAL
ILUSTRAÇÃO/CHATGPT
Balança da justiça pesa aumento do ITCMD em SP, com impacto direto sobre heranças e doações.
Publicado em 9/9/2025 - 11h00
A Reforma Tributária já começa a impactar diretamente os estados, e uma das mudanças mais relevantes para famílias e empresas será na cobrança do ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação). Em São Paulo, dois projetos de lei propõem alíquotas progressivas de até 8%, o dobro do valor atual de 4%. No Congresso, uma proposta discute elevar esse teto para até 16% em todo o país.
"Com a Reforma Tributária, os estados e o Distrito Federal foram obrigados a adotar alíquotas progressivas para o ITCMD. Na prática, isso significa que a alíquota do imposto aumentará de acordo com o valor da herança ou da doação", explica Daniel Cabrera, especialista em direito empresarial, em entrevista ao Economia Real.
A medida obriga estados como São Paulo a abandonarem o modelo de alíquota fixa. "A progressividade tornou-se obrigatória. Isso força os estados a criarem uma tabela com diferentes alíquotas que aumentam conforme o valor da base de cálculo", afirma Cabrera.
Por isso, especialistas recomendam que as famílias antecipem reorganizações patrimoniais e doações ainda em 2025, antes da entrada em vigor das novas alíquotas. "As famílias devem ter um olhar cuidadoso do patrimônio que possuem e quais bens poderão ser mais impactados com as alterações legislativas propostas", orienta Maria Paula Molinar, advogada do escritório Candido Martins Cukier.
"O planejamento sucessório deixou de ser um privilégio das grandes fortunas e passou a ser uma ferramenta de proteção patrimonial acessível e, acima de tudo, necessária. Evita litígios familiares, reduz impactos tributários e garante segurança jurídica às futuras gerações", reforça Cabrera.
Além da economia fiscal, há outro fator de urgência: o princípio da anterioridade tributária. "Uma vez aprovada, a nova lei só poderá ser aplicada no exercício financeiro seguinte e após 90 dias de sua publicação", lembra Cabrera.
Segundo os especialistas, imóveis e participações societárias são os itens que mais preocupam. "No Brasil, os imóveis continuam sendo os grandes 'vilões' no cálculo do ITCMD. Sem avaliação prévia e estratégia, eles se tornam um gargalo no inventário, com atraso na partilha, dificuldade na definição de valor e, muitas vezes, precisam ser vendidos para pagar impostos", afirma Jonathan Camargo, sócio da EQI Private.
"As participações em empresas também foram impactadas. Operações como devolução de capital, distribuição de dividendos in natura ou entrega de bens a sócios podem gerar incidência dos novos tributos", alertam Pedro Paulo Bresciani e Giulia Abdalla, do Utumi Advogados.
A resposta unânime é sim. "Mesmo patrimônios que não são considerados de alta renda podem ser atingidos por alíquotas maiores. Uma família de classe média com um ou dois imóveis pode facilmente ultrapassar as faixas de isenção ou de alíquotas mais baixas", destaca Cabrera.
Para Maria Paula Molinar, o ITCMD deve entrar no radar da classe média. "Este é um tema que não se restringe a 'ultra-ricos'. À primeira vista, pode haver um aumento considerável não só de alíquotas, mas também das bases de cálculo", comenta.
Camargo reforça que o impacto é real: "Famílias com patrimônio entre R$ 5 e R$ 20 milhões entram diretamente no radar. Uma sucessão de R$ 10 milhões pode gerar um peso considerável em impostos. Quem não se organizar em 2025 certamente vai sentir o impacto em 2026".
Um dos cenários apontados pelos especialistas é a criação de uma holding patrimonial, mas com ressalvas. "Holding não é capa de invisibilidade, mas organiza e reduz conflitos. Com ela, as decisões seguem regras de governança e acordos", resume Camargo.
"O trust [espécie de testamento com regras utilizado no exterior] também pode estar sujeito à tributação sucessória. A tendência é de maior fiscalização estadual sobre ativos no exterior", alertam Bresciani e Giulia.
Mesmo com mudanças, a holding segue relevante. "Essas estruturas não são sugeridas com o objetivo apenas fiscal. Há muitas outras implicações por trás, como o estabelecimento de governança", afirma Maria Paula.
Com tantas frentes (jurídica, contábil, fiscal e familiar), o papel do wealth manager (gestor de fortunas) ganha protagonismo. "O gestor de fortunas é como um maestro, um grande conselheiro familiar. De nada adianta o advogado estruturar a holding, o contador fechar o balanço e o private banker cuidar da carteira se não conversam entre si", define Camargo.
"O gestor entra com perspectivas financeiras, alocação patrimonial e liquidez no momento do falecimento. Já os advogados e contadores pensam nas estruturas e documentos. As áreas caminham juntas", complementa Maria Paula.
Este conteúdo integra a série especial do Economia Real sobre a Reforma Tributária. Publicamos novos textos às terças e quintas, com análises práticas para quem quer se preparar desde já para as mudanças no sistema tributário brasileiro.
Política de comentários
Este espaço visa ampliar o debate sobre o assunto abordado na notícia, democrática e respeitosamente. Não são aceitos comentários anônimos nem que firam leis e princípios éticos e morais ou que promovam atividades ilícitas ou criminosas. Assim, comentários caluniosos, difamatórios, preconceituosos, ofensivos, agressivos, que usam palavras de baixo calão, incitam a violência, exprimam discurso de ódio ou contenham links são sumariamente deletados.