FALÁCIA DO DINHEIRO
KUNCHEEK/PEXELS
Planejamento financeiro; falácia do dinheiro alerta pessoas que acreditam em algo ilusório
Publicado em 3/6/2025 - 7h00
Você já ouviu falar na falácia do controle? De acordo com o dicionário, o termo falácia vem do latim fallere, que significa enganar. Trata-se de uma lógica incorreta com aparência de verdadeira: argumentos persuasivos que nos levam a acreditar em algo ilusório. No caso da falácia do controle, é a tendência de superestimar ou subestimar o quanto temos domínio sobre a realidade. E é aí que mora o perigo: ao tentar controlar tudo, corremos o risco de perder o essencial.
Morgan Housel, autor do best-seller Psicologia Financeira, afirma que muitas vezes acreditamos ter mais controle sobre nossas finanças pessoais do que realmente temos — mesmo quando criamos planilhas no Excel e controlamos gastos desde cedo.
Segundo ele, esse excesso de controle pode se tornar uma armadilha perigosa. Por quê? Porque a vida é imprevisível. Ninguém previa, por exemplo, uma crise global como a da Covid-19 e seus efeitos devastadores na economia mundial. Tentar controlar tudo como se o futuro fosse previsível pode levar à frustração e à ansiedade.
Todos gostamos de acreditar que estamos no comando da nossa própria vida. É reconfortante. Acordamos às 5 da manhã, meditamos, tomamos suco verde, vamos para a academia, trabalhamos e contamos com o salário no fim do mês. Segundo Housel, a falácia do controle é exatamente isso: "Acreditar que, se você fizer tudo certo, tudo vai dar certo".
Mas o universo não funciona assim. É como quando tentamos economizar tempo pegando um atalho, mas o Waze nos faz dar voltas por lugares desconhecidos apenas para economizar dois minutos. Achamos que estamos no controle, até perceber que estamos perdidos. Não podemos controlar todas as variáveis do futuro. Se pudéssemos, ninguém teria casado com o ex.
A falácia do controle é uma distorção cognitiva que pode nos levar a julgamentos imprecisos sobre nosso papel na própria vida. Pensamentos como "tudo depende de mim" ou "sou um super-herói que controla tudo" distorcem a realidade. Sim, é importante planejar, mas também é essencial reconhecer os limites desse controle.
Segundo Housel, muitas vezes o melhor que podemos fazer é aceitar que estamos jogando xadrez com o destino — e ele tem mais peças, mais tempo e, às vezes, trapaceia.
Crescemos ouvindo que devemos gastar menos do que ganhamos, economizar, investir e planejar o futuro. Mas nem sempre a vida segue o roteiro da planilha. Isso não significa que devemos desistir do planejamento financeiro.
Pelo contrário: ele não é uma muralha contra catástrofes, mas sim um excelente colete salva-vidas. Em caso de naufrágio, as chances de sobrevivência são maiores para quem está preparado.
Como diz Housel, "o mais importante em finanças pessoais não é fazer tudo certo, é permanecer no jogo tempo suficiente". E como lembra o psicólogo Daniel Kahneman (1934 - 2024), vencedor do Nobel de Economia, a ilusão de que o mundo faz sentido nos leva a erros graves: "A retrospectiva nos dá a ilusão de compreensão, o que pode levar a equívocos em diversos setores".
No mercado financeiro, por exemplo, previsões são frequentemente imprecisas. O Brasil começou o ano com projeções modestas de crescimento e terminou com o PIB dobrando as expectativas, graças a uma safra agrícola surpreendente, maior circulação de dinheiro e queda do desemprego. Ou seja, prender-se às previsões pode ser mais prejudicial do que útil.
Querer acreditar que estamos no controle é uma coceira emocional que precisa ser coçada, diz Housel. A ilusão de controle é mais sedutora do que a incerteza e é por isso que precisamos cultivar a humildade financeira.
Aceitar que investir envolve riscos financeiros é parte do jogo. Entender que nem tudo sairá como o planejado e que isso não é motivo para desespero é maturidade. O dinheiro é parte da vida, mas não é tudo, nem sempre estará sob nosso comando.
Então, como viver bem em um mundo incerto? Sim, ainda vale a pena traçar metas, fazer planilhas e sonhar. Mas esteja preparado para ser flexível. Aceite o que não pode controlar, adapte-se às mudanças econômicas, respire fundo diante das adversidades — como as tarifas internacionais que sobem e descem ao sabor de decisões políticas de grandes economias, como os Estados Unidos.
Tenha uma margem de erro emocional e financeira. Como diz a música de Guilherme Arantes, imortalizada por Elis Regina (1945 - 1982): "Vivendo e aprendendo a jogar. Nem sempre ganhando, nem sempre perdendo, mas aprendendo a jogar".
No fim, o importante é continuar no jogo. Nem sempre o mundo retribui seus esforços. Às vezes, as regras mudam. Os juros sobem. Os planos atrasam. Por isso, além de metas, tenha também um bom Pix de emergência. Ele pode ser a diferença entre o caos e a resiliência.
*As opiniões da colunista não refletem, necessariamente, o posicionamento do Economia Real.
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