FEBRABAN TECH

Na era do Pix, bancos correm para se reinventar com IA e tecnologia

ÇAGRI KANMAZ/PEXELS

Homem usa caixa eletrônico

Homem usa caixa eletrônico; Febraban Tech apresenta novidades do setor bancário brasileiro

Publicado em 10/6/2025 - 7h00

Na década de 1980, começaram a ser instalados no Brasil os primeiros caixas eletrônicos, considerados à época uma revolução tecnológica no setor bancário. Era o surgimento da agência bancária eletrônica: disponível 24 horas por dia para saques de dinheiro, consulta de saldo e outras operações simples, sem a necessidade de enfrentar filas nos bancos. Quem é da minha geração lembra como essa inovação foi amplamente celebrada no país.

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Antes dos caixas automáticos, tirar um simples extrato bancário exigia enfrentar longas filas. Nos noticiários de televisão, a novidade era recebida com entusiasmo. "O século 21 já chegou. Essa é a sensação ao entrar na agência de um grande banco onde um computador conversa com você", dizia uma reportagem da época.

No início, porém, o brasileiro ainda se adaptava à nova tecnologia. Diversos jornais relataram episódios curiosos sobre o uso do caixa eletrônico. Houve quem respondesse verbalmente às perguntas exibidas no visor, acreditando conversar com alguém dentro da máquina. Segundo uma matéria do Estadão, uma mulher chegou a tentar apagar a imagem do extrato balançando as mãos e assoprando a tela. Hoje, porém, essas máquinas correm o risco de cair em desuso.

Os bancos migraram para os bolsos dos consumidores por meio dos celulares. Com os aplicativos bancários, é possível fazer praticamente tudo. Uma pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) mostrou que 30% dos brasileiros não visitavam uma agência bancária há mais de um ano. Outros 70% disseram que evitam ao máximo. O celular reina absoluto nas transações bancárias no Brasil.

Entre 2019 e 2023, o uso do smartphone para interações com bancos mais que triplicou, crescendo 251% e alcançando 130,7 bilhões de operações. Sete em cada dez transações bancárias são feitas pelo celular. A chegada do Pix — que permite transferências instantâneas e gratuitas — acelerou ainda mais essa transformação digital. Hoje, ele é o meio de pagamento mais usado por brasileiros de todas as rendas.

A digitalização bancária cresce exponencialmente no Brasil a cada ano. O país está entre os líderes mundiais em adesão ao modelo de banco digital, superando potências como Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido — perdendo apenas para a Suíça, segundo estudo da Accenture. Esse avanço se reflete nos investimentos: o setor bancário brasileiro é o que mais investe em tecnologia.

De acordo com a consultoria Deloitte, em pesquisa encomendada pela Febraban, o orçamento dos bancos brasileiros destinado à tecnologia deve alcançar R$ 47,8 bilhões em 2024 — um aumento de 13% em relação ao ano anterior. O crescimento está ligado a iniciativas estratégicas voltadas à construção de uma infraestrutura tecnológica robusta, com destaque para a adoção da Inteligência Artificial e, principalmente, da Inteligência Artificial Generativa, capaz de aprender e criar novos conteúdos a partir de dados.

Hiperpersonalização

A Inteligência Artificial Generativa utiliza modelos de aprendizado de máquina conhecidos como deep learning, que simulam os processos de aprendizado e tomada de decisão do cérebro humano. Seu uso promete ganhos expressivos de eficiência, realizando em minutos tarefas que levariam semanas para serem concluídas. Além disso, a IA Generativa proporciona uma experiência mais personalizada para os clientes, com atendimento humanizado e eficiente.

Com essa tecnologia, os bancos conseguem fidelizar clientes que desejam ser tratados de forma única. A chamada hiperpersonalização bancária é apontada como o futuro do relacionamento com o consumidor. Segundo projeções da Stats and Research, esse mercado deve alcançar US$ 21,79 bilhões até 2031. Estudo do Boston Consulting Group mostra que essa estratégia pode aumentar em até 10% a receita anual das empresas que a adotarem.

De acordo com a consultoria Deloitte, 80% dos clientes bancários têm maior propensão a aderir a instituições que oferecem experiências personalizadas. O tema "A aceleração do setor financeiro na era da inteligência" será o foco principal da FEBRABAN TECH 2025, que começa hoje e vai até 12 de junho. No ano passado, o evento — o maior congresso de tecnologia e inovação do setor financeiro — bateu recorde de público.

Lideranças dos setores bancário, tecnológico, de sustentabilidade, telecomunicações, varejo e inovação participarão dos debates sobre o futuro da economia digital. E a IA já está cada vez mais presente no cotidiano do correntista. Ainda neste semestre, o Itaú pretende lançar agentes de investimento comandados por IA para oferecer produtos e serviços personalizados. A expectativa é que até o fim do ano cerca de 70 milhões de clientes tenham acesso à nova tecnologia.

O uso da IA Generativa nos bancos também permite identificar padrões de consumo dos clientes e oferecer recomendações personalizadas em educação financeira. O Banco do Brasil é pioneiro nesse serviço. Desde o início de junho, a IA tem sido usada para sugerir investimentos e linhas de crédito mais vantajosas, alinhadas ao perfil financeiro dos correntistas.

Além disso, a análise de padrões de gastos e receitas permite detectar rapidamente comportamentos fora do comum, o que reforça a segurança contra fraudes bancárias. Só em 2024, a detecção de transações atípicas evitou prejuízos de R$ 4 bilhões em golpes com cartão, boletos e Pix.

Foram 400 mil tentativas de fraude bloqueadas, sendo 95% delas envolvendo Pix. A IA também traz economia: segundo a Juniper Research, o ganho de produtividade pode gerar uma redução de US$ 900 milhões em custos operacionais para o sistema bancário global até 2028.

Inclusão bancária

A abertura do Auxílio Emergencial da Caixa durante a pandemia e a criação do Pix contribuíram significativamente para a bancarização no Brasil. Segundo o Banco Central, entre 2022 e 2023, o número de transações via Pix cresceu 71%, alcançando 42 bilhões de operações.

Apesar desse avanço da digitalização bancária, dados da Serasa Experian revelam que 35,3 milhões de brasileiros adultos ainda não possuem qualquer registro econômico atrelado ao CPF.

Esse contingente representa 21,7% da população adulta do país. Em outras palavras, são pessoas que não têm conta de consumo, financiamento, cartão de crédito ou qualquer outro produto bancário formal. A maioria dessas pessoas vive na região Nordeste e pertence às classes sociais C, D e E, evidenciando os desafios para promover inclusão bancária plena.

Não ter conta em banco, no entanto, é apenas uma face do problema. Segundo o Instituto Locomotiva, 10% dos brasileiros que possuem conta bancária praticamente não a utilizam, caracterizando o fenômeno dos sub-bancarizados — pessoas com acesso limitado aos serviços financeiros. Esse dado reforça a urgência de soluções mais inclusivas no sistema bancário nacional.

O Open Finance, lançado em 2021, é uma das grandes apostas do Banco Central para reverter esse cenário. O sistema permite o compartilhamento de dados entre instituições financeiras, mediante autorização do correntista.

Com mais informações atualizadas e seguras, os bancos conseguem oferecer produtos mais adequados, especialmente crédito, além de promover maior concorrência. Atualmente, o Brasil possui o maior Open Finance do mundo, com 62,2 milhões de consentimentos ativos em janeiro deste ano — um salto em relação aos 43,1 milhões do ano anterior.

Segundo o Banco Central, mais de R$ 1 bilhão já foi contratado via portabilidade de crédito no Open Finance. Houve também um aumento de R$ 700 milhões no limite de crédito oferecido aos clientes e uma economia de R$ 6,5 milhões em juros do cheque especial. A expectativa é que esse ecossistema continue expandindo o acesso a serviços financeiros, em especial para quem mais precisa.

O uso da Inteligência Artificial para avaliar o potencial de crédito e pagamento dos consumidores também promete acelerar a inclusão bancária. Fintechs como a Jeitto já aplicam IA para conceder crédito à população de baixa renda. Utilizando apenas o CPF e o número de celular, o sistema cruza cerca de 400 dados para personalizar ofertas, definindo tanto o valor do empréstimo quanto a quantidade de parcelas, de acordo com o perfil do cliente.

Com essa abordagem, a fintech alcançou uma taxa de aprovação três vezes acima da média do mercado, com tempo de resposta de apenas três minutos e inadimplência abaixo da média nacional. Além da concessão de crédito, a empresa permite transferências, recarga de celular e compras online, tudo sem a necessidade de uma conta bancária tradicional.

Entre janeiro e março deste ano, a Jeitto registrou uma receita bruta de R$ 174 milhões — um aumento de 13% em relação ao mesmo período de 2023. Em 2024, a fintech conquistou 10 milhões de novos clientes e dobrou o faturamento, comprovando que investir em tecnologia e ampliar o acesso de classes mais baixas ao sistema financeiro pode ser não apenas socialmente relevante, mas também um excelente negócio no Brasil.


*As opiniões da colunista não refletem, necessariamente, o posicionamento do Economia Real.

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